
Esta, sem dúvidas, é uma das maiores dificuldades dos escritores: escrever uma boa sinopse, texto fundamental para o processo de venda do livro. E essa não é uma tarefa fácil — há até cursos focados apenas nos textos que vendem o livro no mercado —, mas estamos aqui para dar aquela ajudinha: reunimos os principais pontos que você deve considerar ao escrever a sinopse do seu livro:
Tamanho do texto
Minha sugestão, e é o que praticamos aqui, na Coerência, é que você opte por uma sinopse curta: no máximo mil caracteres com espaços; se puder, até menos.
A maioria dos leitores não se interessa por sinopses longas, e é comum que até desistam da leitura ao se deparar com uma contracapa com muito texto. Há alguns leitores que não se importam, e até preferem textos maiores, que dizem mais sobre o livro? Há, e no caso do livro físico você pode usar a orelha para trazer um texto complementar à sinopse.
Quer estratégia melhor do que atingir os dois públicos, o que gosta de textos curtos por meio da contracapa e o que gosta de textos maiores com a contracapa somada à orelha?
Quais informações contar
É fundamental que você apresente os protagonistas e o conflito principal da trama, que costumam ser os fios condutores da obra; normalmente, é por meio das decisões do protagonista que os eventos vão se desenrolando na narrativa, e costuma ser o conflito principal que o motiva a tomar essas decisões. É também importante que você informe ao leitor em qual contexto o protagonista e o conflito estão inseridos.
Qual peso dar a cada um deles depende do gênero: em uma fantasia, dar destaque ao cenário, um universo novo, criado pelo autor, é essencial, assim como em uma distopia o contexto que levou a humanidade àquela situação, ou até o contexto social no qual os personagens se encontram, tem grande relevância.
O pulo do gato
Saber a medida certa de revelações é muito importante. É preciso revelar o necessário para despertar o interesse do leitor, mas não o bastante para que ele encontre respostas para as perguntas que se fez durante a leitura, porque é a vontade — ou até a necessidade — de encontrar essas respostas que o fará investir na leitura.
Palavras-chave e tom
Algumas palavras automaticamente despertam o interesse de determinado público-alvo, e normalmente o leitor nem percebe, mas elas influenciam sua decisão de compra. Leitores fãs de romances gostam de ler palavras como “amor”, “paixão”, assim como os de drama têm seu interesse despertado ao ler “superação”, “trágico”.
Outro ponto muito relevante é o tom do texto que apresentará o livro: ele deve refletir o tom da narrativa, o que está ligado ao gênero e, consequentemente, ao público-alvo. Uma comédia romântica precisa de um tom divertido, assim como um terror precisa de um tom sombrio. Lembre-se que a mesma mensagem pode ser contada de diversas formas diferentes, e acertar nessa forma é fundamental quando estamos falando de sinopses.
Esses são o que considero os pontos principais. E como quero ajudar você de verdade, vamos de um exemplo para deixar as coisas mais claras? Veja a sinopse de Uma mulher no escuro”, de Raphael Montes, publicada pela tradicionalíssima Companhia das letras:

“Victoria Bravo tinha quatro anos quando um homem invadiu sua casa e matou sua família a facadas, pichando seus rostos com tinta preta [contexto]. Única sobrevivente, ela agora é uma jovem solitária e tímida, com pesadelos frequentes e sérias dificuldades para se relacionar. Seu refúgio é ficar em casa e observar a vida alheia pelas janelas do apartamento onde mora [protagonista], na Lapa, Rio de Janeiro [cenário]. Mas o passado bate à sua porta, e ela não sabe mais em quem pode confiar. Obrigada a enfrentar sua própria tragédia, Victoria embarca em uma jornada de amadurecimento e descoberta que a levará a zonas obscuras, mas também revelará as possibilidades do amor [conflito]. Um psiquiatra, um amigo feito pela internet e um possível namorado — qual dos três homens está usando tudo o que sabe para aterrorizar a vida de Vic? E o que afinal ele quer com ela? [reforço de conflito]”
A sinopse de “Uma mulher no escuro” tem 822 caracteres, nos quais são apresentados protagonista, conflito, cenário e contexto. São reveladas as informações necessárias para despertar o interesse do público-alvo (leitores de suspense): protagonista com passado sombrio, o que a tornou uma pessoa com problemas, que certamente influenciarão suas ações durante o enredo; assassino voltando para buscar uma sobrevivente; assassino com modus operandi; coadjuvantes não confiáveis, os quais o leitor terá de investigar durante a leitura; bônus: um possível romance, mas não daqueles melosos, fofos. As palavras-chaves são aquelas que fazem o público-alvo salivar [aqui grifadas em negrito]. Para fechar com chave de outro, caso o leitor não tenha feito perguntas ao longo da leitura (duvido!), a sinopse entrega duas de bandeja.
Eu, sem dúvidas o público-alvo de Raphael Montes, ainda não li “Mulher no escuro”, mas já estou aqui me remoendo: quem matou os pais de Victoria e por quê? Que coisa bizarra é essa de pichar o rosto? É um fetiche, trata-se de um assassino sexual? É uma necessidade, pois a vítima conhece o assassino? É um capricho de um serial killer? Observar a vida alheia? Victoria é voyeur, ou é o fato de eu ser fã de romances hot que está me conduzindo pra esse lado? Algo peculiar há nessa história de observar os outros pela janela, senão essa informação não estaria na sinopse. Esse passado voltando é na forma do assassino dos pais, né? “Zonas obscuras”? Deve ser na própria mente dela… Psiquiatra, amigo ou namorado… qual dos três é o vilão?! Ou estão me enganando, e não é nenhum dos três? Deve ser o psiquiatra… O que será que essa pessoa sabe sobre Vic (nesta altura, já sou íntima da protagonista)? Ah, deve ter alguma coisa a ver com o fato de ela ficar bisbilhotando a vida dos outros pela janela!
Tá! Eu preciso ler “Uma mulher no escuro”! No mínimo, vai pra minha lista de desejados. Se você gosta de suspenses, deve estar na mesma situação que a minha. Esse é o poder de uma boa sinopse.
Correndo o risco de este artigo ficar grande demais, vamos a mais um exemplo, desta vez nosso — Rio de Sangue, de Alexsander Gonçalves —, de modo que poderemos comentar as decisões que foram tomadas na feitura do texto. E, como cada caso é um caso, vamos trabalhar um caso fora da curva, que costuma exigir mais do que casos comuns.

“Em uma noite de domingo, as redes sociais, rádios e jornais são tomados pela notícia de que um suposto grupo de criminosos está ceifando vidas brutalmente [contexto]. A princípio, a imprensa divulga o evento como um caso corriqueiro na violenta cidade do Rio de Janeiro [cenário], no entanto a matança vai ganhando maior proporção, até que já não se pode fazer mais nada: é tarde demais. A população carioca vai descobrir da forma mais assustadora possível que as ruas da grande metrópole continuarão banhadas em sangue, porque não se trata de um caso isolado, e sim de um vírus fatal, que se espalha rapidamente pela cidade maravilhosa [conflito].”
Do ponto de vista de análise, talvez a primeira coisa que chamou a sua atenção tenha sido o fato de os protagonistas não serem mencionados nessa sinopse. E, claro, há protagonistas nessa história. No entanto, pelo menos nesse primeiro volume da série, a verdadeira protagonista é a violência — o público-alvo é muito bem definido aqui; não é um livro para qualquer um. Nesse ponto da história, os protagonistas conseguem apenas sobreviver. E é por isso que a violência é o ponto alto dessa sinopse, o que exploramos por meio de palavras-chave e tom.
Outro ponto bem explorado nessa sinopse é o fato de revelarmos pouco, deixando o leitor cheio de perguntas. A casa caiu, e agora?! Que vírus é esse? O que faz com as pessoas? O que aconteceu com a população? Como o governo vai lidar com isso? O livro aborda essa questão política? Leia para descobrir.
Nesse caso, trata-se de um livro físico, então há ainda o texto de orelha, no qual trouxemos mais informações, inclusive sobre os protagonistas, para o leitor de terror que não se convenceu com a sinopse — é importante levar em consideração todos os aspectos da capa; se tivéssemos apenas a contracapa (e-book), talvez a estratégia fosse outra.
“Recém-chegado ao sudoeste do país para a comemoração de oito anos de casamento com seu parceiro, Henrique decide convidar os amigos mais próximos para um jantar em seu apartamento na Tijuca. Focado em seu compromisso, o rapaz não dá atenção à desordem ao seu redor, alheio ao fato de que um vírus contagioso está transformando as pessoas em assassinos irracionais sedentos por sangue, que dilaceram todo aquele que se colocar em seu caminho, independentemente de ser um conhecido ou não. Ao perceber a gravidade da situação, o comissário de voo entende que ele, seu companheiro e seus amigos precisam sair em busca de segurança. Agora, para se manterem vivos terão de enfrentar diversos obstáculos, o que se torna ainda mais difícil quando descobrem que os infectados não são seus únicos inimigos. Resta saber se a busca pela sobrevivência assomada à fome e ao cansaço permitirá que a humanidade de cada um deles seja conservada… ou não.”
Considerando as perguntas que os leitores se fizeram ao ler o texto de contracapa, algumas respostas foram encontradas na orelha, mas novas perguntas foram despertadas. A técnica se mantém: informe o necessário para despertar o interesse do leitor, para conduzi-lo a fazer perguntas, mas não o suficiente para que as respostas sejam encontradas. A análise desse segundo texto fica com você como exercício.
Espero que este post o ajude a escrever uma sinopse incrível para o seu livro. Me conte aqui nos comentários; aproveite para me dizer no que mais podemos ajudar por meios dos próximos artigos. Um abraço, e até a próxima.
Sempre cirúrgica. Adoro seus textos, Bianca!